28.1.09
Quando eu era pequenina, acabada de nascer, ainda mal abria os olhos, já era para te ver.
Era assim que se repetia um fado, de Amália, na voz da minha mãe. Vezes sem conta. Por toda a casa. Quase todos os dias. Quase todos os dias se ouvia ou cantava fado naquela casa. E eu gostava. Quando eu ainda era pequenina embalava nessa melancolia e sei que a minha mãe chegou a pensar que estava a exagerar, porque eu não ria. Não ria ás gargalhadas como aquelas crianças que se viam divertidas. E não é que não fosse uma criança feliz. Brincava sozinha todos os dias no chão o meu quarto, onde construía cidades inteiras, com legos, barriguitas, barbies, pin-i-pons, legumes e frutas e os papéis que sobravam do banco do meu pai e brincava feliz. Aos fins-de-semana sentava-me toda contente à porta do quarto dos meus pais, agarrada à almofada, em silêncio, à espera de os ouvir falar, para poder entrar no quarto. Durante a semana chegava a casa e ia fazer os deveres, antes mesmo dos desenhos animados e do lanche. Mesmo que me chamassem para a sala, não ia sem acabar os trabalhos de casa porque estava feliz a fazê-los. Ainda mal abria os olhos e já conhecia nove meses de letras e refrões, uns mais entoados, outros mais desgarrados. Porque naquela casa sempre se ouviu fado. E não éramos tristes.
Eu era só uma criança que não ria. E ainda hoje não me rio, quando ouço fado. O fado também não ri.
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7 comentários:
o fado também não ri.
Vou acabar com essa frase.
Posso?
...espero que td se resolva lá no meu cantinho.
E o fado tbém não me faz rir...faz-me pensar!
Fado é fado.
a minha mãe cantava-me o mesmo. e eu ainda o sei de cor.
Alexandre, não deixa de ser com surpresa que leio o teu comment. ;)
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