26.9.07

Antes de saires


José

Não me peças para esperar, nem para ter paciência. Mais.
Vou-me embora porque sabes bem que isto um dia tinha de acabar.

Rita
Mas tem de ser agora?
Eu agora ia fazer um chá!

José
Tem de ser agora, sim.

Rita
Se tem de ser assim, então vou guardar a outra chávena.
Demoras muito?

José
Não estás a ouvir o que te digo? Eu vou e já não volto!

Rita
Eu estou a ouvir estou, mas não acredito.

José
Então, quando eu bater a porta, pode ser que acredites finalmente.

Rita
Zéeeee... antes de saíres...

José
É a ultima coisa que me dizes Rita!

Rita
... antes de saíres, diz-me só onde escondeste o presente dos nossos 50 anos de casados que tens para mim?

25.9.07

Vida morna


Ainda
pior que a convicção do não e a incerteza do talvez é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi. Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem quase morreu está vivo, quem quase amou não amou. Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas oportunidades que se perdem por medo, nas ideias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no Outono.
Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados. Sobra cobardia e falta coragem até para ser feliz. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza. O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.
Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance, para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos somente paciência porém, preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer. Para os erros há perdão; para os fracassos, oportunidades; para os amores impossíveis, tempo. De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance. Não deixes que a saudade te sufoque, que a rotina te acomode, que o medo te impeça de tentar. Desconfia do destino e acredita em ti. Gasta mais horas a realizar do que a sonhar, a fazer do que a planear, a viver do que a esperar, porque embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu.

Fernando Pessoa

19.9.07

Anxious


Por vezes esperas.

Por vezes demais.
Tentativa falhada,
s
e a vontade se sente e se trai.
Porque não é crucificada?

Um dia talvez consiga pôr o silêncio a falar.


Por vezes esperas.
Por vezes demais.
Aposta perdida,
se a sorte se tem
e se vai.
Porque não é amarrada?

Um dia talvez consiga pôr o vento a voar.

Por vezes esperas.
Tentativa falhada, aposta perdida,
Por vezes são demais.

Mas um dia consigo pôr o mar dentro de um copo
só para te dar a água salgada a provar.