29.8.07
Cansada
O cansaço fraqueja-lhe os olhos, satura-lhe as pernas, corroi-lhe a alegria. Rouba luz aos olhos, leveza à pele e vontade ao ser. O cansaço tomou conta dela, abruptamente, dois dias antes das férias. Não chegou a fazer a viagem que tinha planeado. Viajou de ambulância para o hospital mais próximo e os dias passou-os na cama.
Cansada de lutar, da batalha, da espera. Cansada de ser fillha, de ser mãe, de ser amiga, de ser namorada, de ser amante, de ser mulher, de ser vulnerável, instável, de ser senhora, de ser dona. Cansada de ser empregada, de ser patroa, de ser licenciada, de ser qualificada, de ser escrava. Cansada de ser invejada, de ser desrespeitada, de ser frustrada. E cansada de ouvir e ficar calada.
Cansada de tomar decisões, cansada de tomar decisões sozinha, cansada de estar sozinha naquela cama branca naquele quarto, deu um suspiro e rendeu-se ao cansaço.
2.8.07
Inconstância e Incerteza
Um dia, Inconstância encontrou-se na rua por acaso com Incerteza, e tiveram uma longa conversa.
A Inconstância tinha certezas, mas mudava de postura a cada 10 minutos. Ora agora estava segura, ora já não estava segura de nada. Da tranquilidade à ansiedade como as montanhas russas. Mas certezas, Inconstância tinha. Por outro lado, a Incerteza era muito segura de si e das suas palavras. E acima de tudo, era muito segura no que tocava às suas incertezas. Essas eram sempre as mesmas, independentemente da conjuntura, do ano ou da estação. Não tinha a certeza de nada, excepto que tinha acerteza das suas incertezas. Após algum tempo de efusiva troca de sufixos, adjectivos e verbos, acordaram em fazer uma operação. Miss Inconstância e Madame Incerteza seriam submetidas a uma plástica do género trasformativo. E assim, Miss Inconstância passou a assinar o seu Bilhete de Identidade com o nome Constância e Madame Incerteza passou a ser apenas Certeza.
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