25.9.08

Num sinal STOP


Será que é o medo que me impede?

Servir Portugal


Pega-se em metade do Oceano
e juntam-se-lhe terras desconhecidas.
Deixa-se marinar alguns anos
e tapa-se com um manto de neblina.
Lavam-se as saudades em lágrimas
e põe-se a glória em banho Maria,
para voltar a usar um dia.
À parte coloca-se o fado bem apurado,
o futebol bem jogado, e um ou outro pregão
das entranhas gritado.
Desfaz-se a língua em poemas,
odes e cantigas
ou então canta-se à desgarrada.
Rima improvisada.
Numa grande forma de barro
escalda-se o Algarve e o Alentejo,
salgam-se as Beiras e desfaz-se em água
o Douro e o Ribatejo.
Para terminar abanam-se as Oliveiras
com sabedoria ancestral.

Rega-se tudo com um fio dourado.
E serve-se assim Portugal,
como prato principal.

Azeite Gallo. A cantar desde 1919

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Texto da última campanha do Azeite Gallo, realizado pela BBDO Portugal.
Parabéns ao meu colega copy, e ao realizador e ao director de arte e ao director de fotografia e à equipa de produção. Brilhante! O making-off aqui e o filme aqui:


22.9.08

Alguém me pode oferecer?


A cadeira amarela, a ventoinha verde e os pins de parede?
Respondam aqui que eu dou-vos a minha morada.
OBRIGADA.

Criaturas*


Aqueles seres que estão no limiar entre o ser humano e o animal.

*mais conhecidos como clientes

17.9.08

Amo este Homem

Por estas e por outras.



























Jpg que fiz para partilhar com vocês.
Já é do fim de Julho da revista Visão, mas é intemporal.
Clicar em cima da imagem para ler.

A minha mão


Tem meia vida traçada. O aperto é forte, dessa juventude que ainda se vê. As marcas vão ficando, das correrias, dos brinquedos, das noites, dos gatos. Tem cinco dedos. Podia ser do outro sexo, pela indelicadeza dos traços, mas está decorada de verniz, que não deixa enganar. Tem cinco dedos. Completos. E unhas compridas e verniz de cor garrida, e por vezes tem anéis, que lhe valem pouco mais do que enfeite. Tem cinco dedos. Completos e angustiados. Sem papel, tem cinco dedos incompletos.


(1º exercício: 1 minuto)

16.9.08

Silêncio

Por favor cala-te. Calem-se todos. Deixem o silêncio falar, que eu preciso de o ouvir. Hoje mais do que nunca, não me posso deixar adormecer e ele mantem-me acordada. Por favor desliguem os motores, baixem os estores com cuidado, fechem as portas com vagar, que eu preciso do silêncio para acordar. Escuto o que me diz, sem um pio, sem um som, sem ruído, sem contestar. Com toda a razão, tamanho é o etéreo de uma massa vasta, vazia de agudos e de graves, tamanho o alcance que pode ter quando não tem nada para dizer. Entra devagar pelas frechas das portas, pelos buracos das fechaduras, às costas de um gato, entra devagar e instala-se num canto. Ele sabe esperar. E quando tudo se cala, quando eu preciso, ele sim, começa a falar.

12.9.08

11.9.08

Dominik Eulberg - Björn Borkenkäfer

Extrawelt - Titelheld



Para ouvir e dançar até cair para o lado.
Ouvir melhor em last.fm

9.9.08

Sai


Há qualquer coisa dentro de mim que quer sair, mas não sai. Nem com forceps, nem empurrando. Nem com murros, nem vomitando. Há qualquer coisa atravessada, ameçada pela crítica, pelo julgamento feroz que insiste em esconder-se e a esconder-me do autêntico que sou eu e ninguém sabe. E até eu começo a esquecer. Há qualquer coisa dentro de mim que podia ser mais, mas que não deixo jamais trespassar. Há qualquer que começa a ganhar mais força, mais forte do que eu própria, uma força que só ela tem e que está a ser difícil de continuar a abafar. Há qualquer coisa dentro de mim, que uns dizem chamar-se alma, que parece que me quer abandonar, mas lá no fundo, só quer gritar. Há muito que qualquer coisa dentro de mim está em coma e agora eu tenho de lhe dar as mãos. E puxar. E ressuscitar.

8.9.08

Cut Copy - Hearts on Fire



Fecho os olhos e de repente estou no meio da pista e sou a estrela e brilho mais que a bola de espelhos e danço melhor que nunca e não me sinto cansada. E de repente brilho e sou uma estrela e subo, e todos olham para o tecto e eu continuo a dançar no centro da pista e parece que estou a flutuar. Não me sinto no chão, não me sinto presa, sem movimentos previsíveis, cem movimentos saiem ao mesmo tempo e eu sou a estrela e brilho mais, muito mais que os demais.

Da amizade e essas coisas


É garantido tomarmos as amizades por garantidas, mas as amizades, tal como o amor são frágeis e mutáveis. É garantido que na vida teremos amigos que duram e amigos que passam, amigos que marcam e aqueles que se desmarcam. É garantido que teremos companheirismo, horas de risos e algumas de choro, segredos mais íntimos revelados pelo chão e pelos copos, promessas vãs de
eternidade sob um qualquer balcão de um bar a fechar. É garantido que teremos pedidos de desculpa sentidos, telefonemas não retribuídos sem razão, desilusões que gostaríamos de evitar e arrependimentos que teimam em nos marcar. É garantido que chega um dia em que que queremos acabar com tudo, lavar a roupa suja e recomeçar, mas o que a amizade tem de garantido é o passado e as bases que a fizeram alicerçar. Um dia podemos virar costas e abandonar a amizade, mas nunca o conseguimos, nem que mudemos de país, porque uma amizade faz parte de nós, como nós fazemos parte dela e por mais que se queira, se ela for mesmo amizade, virá atrás.

6.9.08

Questão


Pensa metade do que diz ou diz metade do que pensa?

2.9.08

Do amor e essas coisas


A verdade é que nunca o amor será eterno. Nunca será para sempre. Mesmo o amor daqueles que nos dão vida. A verdade é que temos de nos habituar a esta ideia. E à ideia de que a morte, a doença, a política ou a religião nos poderão levar isso que tínhamos como garantido. A verdade é que os amores partem, mudam e mudam-se de coração, e havemos de nos debater com esse desconsolo por toda a humanidade. A verdade é que o amor tem dessas coisas e podemos
continuar a achar que fizemos alguma coisa mal, ou que o outro fez algo mal, ou a questionar o porquê, o como ou o quando. A verdade é que acontece todos os dias, a todas as horas, e vai acontecer a cada um de nós pelo menos uma vez. A verdade é que podemos fugir, mas não nos podemos esconder, porque o amor tem destas coisas. Coisas que nunca vamos conseguir perceber.

27.8.08

Palavras que gosto sem razão


Sarrabeco
Beldroegas
Cutumiço

Chafarica
Borbotos
Esquálida
Borgalhotas
Peúgos
Barbaridade
Ceroulas
Mirabolante
Regueifas
Pimpolha
Cacachuete
Muchacha
Pespineta
Rebiteza


...


to be continued

26.8.08

Thank You Paul


“TRAPPED. It’s not because you are making the wrong decisions. It’s because you are making the right ones. We try to make sensible decisions based on the facts in front of us. The problem with making sensible decisions is that so is everybody else.”

“I WANT. Making the safe decision is dull, predictable and leads nowhere new. The unsafe decision causes you to think and respond in a way you hadn’t thought of. And that thought will lead to other thoughts which will help you achieve what you want. Start taking bad decisions and it will take you to a place where others only dream of being.”

“ARE YOU BEING REASONABLE? Most people are reasonable; that’s why they only do reasonably well.”

By Paul Arden
"Whatever You Think, Think the Opposite"

Vou comprar maçãs


Um dia destes vou comprar maçãs e não volto.

6.8.08

Fórmula de emagrecimento


Comprovada e atestada. Ao que parece mudar de emprego ou o divórcio tem resultados bombásticos na perda de peso (particularmente em zonas localizadas). Sendo que eu não posso fazer o segundo tratamento, vou tentar o primeiro.

Wish me luck.

5.8.08

Abandono


Não sabe o nome da rua onde vive. Não sabe que horas são manhã, nem noite. Não sabe dizer um único nome, nem distinguir as cores. Não sabe escrever, não sabe ler e não sabe falar nem compreender as palavras com exactidão. Não percebe de política, de terrorismo, da fome, nem tão pouco do aumento do preço da gasolina. Não tem dias de férias, porque não tem dias de trabalho. Não sabe se o preço dos alimentos está cada vez mais caro, nem que é preciso mais contenção. Mas sabe que quando uma porta se abre é sinal de alegria. Sabe que quando uma porta se abre significa passear ou o dono a regressar a casa. Não sabia que naquele dia aquela porta que se abria e que o levava directamente a um lindo jardim, se fechava. E afastava, afastava fechada.


Um bem-haja à S.O.S Animal, União Zoófila, Liga Protectora dos Animais e a tantas outras pelo trabalho na ajuda e protecção dos Animais Abandonados.

30.7.08

Vento


Gosto quando o vento
tem a força de empurrar o meu
corpo displicente
e de arrastar o meu
cabelo como se ele não
me pertencesse.

29.7.08

Para Louis, o Artista...


"
Em Março fui a Paris para uns colóquios na Sorbonne e na Fundação Gulbenkian: estranha coisa falar e ouvir falar dos meus livros. As pessoas tão generosas e eu a sentir que mal comecei. Em Março ou Abril? Princípio de Abril, julgo que princípio de Abril, as flores começavam, cheirava um bocadinho a sol. Jantava todas as noites com a Dominique e a Victoire, a mulher e a filha do Christian Bourgois, meu editor, que morreu em Dezembro. Meu editor, meu amigo. Tenho tantos editores e não sou amigo de quase nenhum. Do Christian era, sou. Nunca foi um homem fácil. Eu também não. E, no entanto, que maravilha de conversas no silêncio, que partilha tão grande. Desde muito cedo, como ele o disse, fez seu o preceito de um general veneziano do século dezassete, chamado Montecuculi. Montecuculi não lembra ao Diabo. Afirmava o general que é preciso agarrar sempre a ocasião pelos cabelos mas não esquecer que ela é careca. E isto é o único programa de vida possível. A casa desabitada sem o Christian e no entanto a sua presença em toda a parte. Parece um paradoxo: não é. Jantares difíceis para mim, carregadinho de saudades. Tantos anos de trabalho juntos, decepções, alegrias. Não há escritor no mundo que admire tanto como tu, escreveu-me na carta em que anunciava o cancro. E depois três anos. E depois nada. A Dominique e eu falámos e falámos para mobilar o silêncio. Até de livros. A certa altura veio com um álbum da Plêiade dedicado a Faulkner, escritor dantes tão importante para mim: – O que o homem sofreu a vida inteira
disse ela. E de facto sofreu como um cão a vida inteira. Respondi
– Conheces algum artista que não sofra, conheces algum artista feliz?
Todos eles atormentados, contraditórios, num desespero e numa angústia constantes, mesmo sob o humor, sob a alegria. Os meus queridos russos, Tolstoi, Gogol, Tchecov. Scott Fitzgerald, que sustentava não ser possível escrever a biografia de um escritor porque ele é muitos. É necessário roermos as passas do Algarve para que o leitor tenha prazer. E que mistura de sangue e júbilo na criação, outros sentimentos de que não falo por pudor. Graham Greene agora, para variar: «um escritor é um homem de barba por fazer e copo na mão, cercado de criaturas que não existem». E Gogol destruindo toda a segunda parte das Almas Mortas, uma obra-prima, chorando. Já que estou em maré de citações lembro-me de Apollinaire, poeta com quem aprendi muito: «piedade para nós que trabalhamos nas fronteiras do ilimitado e do futuro». Era isso que ele suplicava: piedade para nós, tende piedade de nós. A beleza que nos dão saiu-lhes do pêlo, rasgaram a alma por ela. E a Dominique a olhar para mim com a tal piedade que Apollinaire desejava. Como é possível coexistirem num só homem ou numa só mulher tanto sofrimento e tanta exaltação? O apartamento do Christian, cheio de quadros, retratos, livros. As árvores dos Invalides, a rua Vaneau, onde Gide morava, a mesma do hotelzinho em que fico sempre, no quarto sessenta e cinco com vista para um jardim. Os pombos de Paris tão diferentes dos pombos de Lisboa, esguios, ferozes, poisados nos ramos, não nas casas. Piedade para nós, etc., piedade para o nosso trabalho. Quero morrer de caneta na mão, meu Deus fazei com que eu morra de caneta na mão a lutar com as emoções, as palavras. A lutar com o Anjo, pobre Jacob que sou. A gente deixa a pele nisto. Se alguma glória posso ter é essa: não os prémios, o reconhecimento, o louvor: apenas a sina de uma vida dedicada a tentar iluminar o mundo com a minha lanterninha. Por muito grande que seja não passa de uma lanterninha. Graham Greene enganou-se, as criaturas que ele diz que não existem, existem de facto: somos nós. Habitamos o Monte dos Vendavais, a Guerra e Paz, as Meninas de Velázquez, os trios de Beethoven, o Danúbio Azul, e ao habitar o imenso país que essas obras são vencemos o tempo e tornamo-nos imortais. Apollinaire dizia piedade para nós, e em lugar de piedade o que devemos sentir é gratidão: deram nexo à nossa existência. Fizeram da gente seres enormes, apesar de bichos da terra tão pequenos como no verso de Camões. Esta é a ditosa Pátria minha amada: nunca li tal coisa sem me comover. Parece tão simples, não é? Esta é a ditosa Pátria minha amada: reparem na mão que é necessária para chegar a isto. A Dominique:
– O que o homem sofreu a vida inteira
e é verdade. Sofreram a vida inteira, mas é graças a eles que estamos vivos. É graças a eles que somos dignos do Reino dos Céus, que trouxeram para a terra. E os pombos de Paris a olharem para mim de banda, com vontade de me engolirem. Por favor não me engulam por enquanto: há tantos livros em mim à espera de serem escritos."


António Lobo Antunes, Visão

Um conto em script

QUEDA

20 horas, Brasil, Rio de Janeiro. Começa a festa mais badalada do ano. As meninas da alta sociedade que tinham atingido a maioridade, iam estrear-se no baile de debutantes. Nervosas preparam-se para entrar. O chão é de um luzidio mármore branco.

01 hora, Portugal, Sesimbra. Num bar de praia está marcado um concerto reggae, seguido de um Dj. Os apreciadores amontoam-se lá dentro e à porta. O chão está coberto de areia.

21 horas, Inglaterra, Londres. Num restaurante japonês um grupo de amigos comemora um aniversário. Só falta uma pessoa, que está presa no trânsito, para o grupo ficar completo. O chão é de tábua de madeira corrida.

Maria põe o imaculado sapato branco, no primeiro degrau da escadaria. Coloca a mão no corrimão e finca os dedos, enquanto observa a composição da sala. Estava muita gente e ela não podia chamar a atenção. Os sapatos novos e muito altos prendiam-lhe a circulação nos pés.

Ana entra com as amigas na festa. A batida reggae já se sente e aproveita para exibir a sua figura, bem justa por baixo das calças de ganga e do top, ao ritmo descontraído da música. Uma manequim tem de estar sempre fabulosa, pensou. Olha à sua volta e vê outros colegas de profissão. Dirige-se a eles, enquanto folga o lenço que lhe aperta o pescoço.

Sara sai atrapalhada do táxi. Deixa cair o porta-moedas e molha o cinto da gabardina na poça de água, quando se baixa. Passa a mão pelo cabelo e compõe o gancho. Tinha de estar sedutora. Respira fundo e antes de empurrar a porta, puxa para baixo a armação do soutien, que lhe magoa o peito.

O pai de Maria inicia-a na primeira valsa, após a entrada glamourosa. Os pés continuam apertados, mas a dor ajuda a que se concentre mais. Enquanto vira e rodopia, coloca os olhos nos vestidos e jóias das outras, mas principalmente nos rapazes da sala. Era a sua apresentação oficial à alta sociedade brasileira, embora já conhecesse muito bem uma grande parte dela. A festa da sua maioridade vinha tarde. Há muito tempo que era mulher.

O fotógrafo da revista da moda tira a primeira fotografia a Ana. Mexe no lenço que a sufoca enquanto faz uma ou duas caras mais fotogénicas. Ao ritmo dos disparos do flash repara nas outras manequins da festa. Não era a sua primeira party rodeada de outros modelos, mas como habitual sentia-se insegura. Conhecia toda a gente do meio, mas não conhecia ninguém.

O aniversariante recebe Sara de braços abertos e convida-a sentar-se ao lado dele. Sente a armação do soutien a entrar pelas vértebras adentro e falta-lhe o ar. Tenta distrair-se com a conversa e a decoração do restaurante. A toda a volta cetim vermelho e preto, flores de lótus e lanternas. Antes do sushi, já tinha bebido dois copos de saké. Queria sentir-se solta e desinibida para fazer o que tinha vontade.

Maria finalmente pára para descansar os pés, que já não sente. Não que o pai dançasse mal, pelo contrário, mas querer esconder uns avantajados 39, numa forma de 38 só podia provocar o entorpecimento. Tudo corria como previsto. Ninguém desconfiava de nada. Ninguém se desmanchava.

Ana dança ao som do reggae, com o lenço a bambolear sobre o peito e com o olhar perdido. Não que o ambiente não estivesse interessante para se olhar, mas queria esconder-se no meio de toda a gente. Parecia que tinha conseguido. Já ninguém lhe tirava fotografias nem pedia autógrafos.

Sara finalmente sente-se solta. Já nem sente a armação do soutien. Não é que este estado de espírito fosse natural. O saké fez a diferença pretendida. Estava perto do seu objectivo. Ninguém parecia importar-se com o que fazia.

A debutante Maria, decidida a mais umas danças com os rapazes novos, levanta-se e dirige-se para o centro do salão. Passa por um grupo de senhores distintos que entre dentes sussurram “...olha esta... toda de branco... não me engana... é uma das garotas insaciáveis das noites de máscara... sei pelo cheiro” Todos riem em uníssono, como só um clube privado pode fazer.

Ana, manequim de sorrisos amarelos, decide ir refrescar-se à casa de banho. Pelo caminho dos encontrões, encontra quem não queria. Afasta-se, desvia a cara, mas num puxão disfarçado de carinho, ele agarra-a pelo lenço do pescoço e chega-a de encontro ao peito. Passa-lhe a língua pela orelha e murmura... “foste a minha melhor virgenzinha... que saudades...”

Sara com o calor, do álcool e das hormonas, vai à casa de banho retocar a compostura. Molha o pescoço de olhos fechados enquanto ouve a porta a mexer. Abre os olhos de rompante com o toque de uma mão entre o peito e o soutien. A mulher revela-lhe ao ouvido “estás linda hoje... queremos os dois ficar contigo.”

Maria tenta sair num andar acelerado sobre o deslizante chão de mármore branco. Os pés não resistem e cai sobre o imaculado salão de baile.

Ana tenta soltar-se com um movimento brusco, mas o lenço na mão do homem aperta-lhe o pescoço e dá-lhe um esticão que a atira para o chão de areia do bar.

Sara com a sua mão pega na mão da outra e fá-la deslizar suavemente para fora do vestido. Ajeita a armação do soutien e quando dá o passo em direcção à porta, escorrega na humidade e cai seca no chão de madeira.

São 23 horas e acabou o baile.

São 04 horas e acabou o concerto.

São 00 horas e acabou o jantar.

25.7.08

Not up,
not down.
On the side.
But not left,
neither
right.


















Betty: "Louco é aquele que faz repetidamente as mesmas coisas, na esperança de que o resultado seja diferente."

Daniel: "Mas eu não sei como mudar as coisas que faço."
Betty: "Se calhar tu é que tens de mudar, e assim o que fazes acabará por mudar também."






24.7.08

Em Lisboa não se dá o troco à mão


Triste constatação a minha. Após uma semana de empenhada investigação concluí que nos cafés/ pastelarias/ esplanadas desta nossa cidade há um código que impede os empregados de entregar o troco em mão. O que me deixou já, por várias vezes, de mão estendida enquanto olho para as moedas a serem colocadas com estridente acompanhamento sonoro no balcão... 2 centímettros ao lado da minha mão. Eu não sei se é pelo estigma de ter a mão estendida, como se de uma esmola estivesse à espera, mas de facto o que tenho pago ultimamente por um pãozinho com queijo e um Compal Fresh, faz-me começar a pensar se não estarei à espera de uma esmola e não do troco.

Mas, dizia eu, não sei se é pelo estigma, mas a verdade é que não há o hábito de entregar o troco a quem já tem a mão estendida à espera dele. E isso chateia-me profundamente. Chateia-me tanto que hoje, acompanhada do meu mau-humor matinal, não me contive mais e repondi à senhora do café, num tom difícil de explicar, mas que se encaixava entre o comentário, crítica e a rabujice "mas porque é que não me dá o troco na mão? Estou aqui de mão estendida e a senhora coloca o troco em cima da mesa, faz-me fazer figura de parva e ainda perder mais tempo a amealhar estas pequenas moedas que teimam em ficar coladas ao balcão".... Acho que fui um bocado caústica, mas a verdade é que provoquei uma reacção numa mente que nunca antes tinha pensado nisso. Não sei em que é que a vida daquela senhora vai melhorar ou piorar depois da minha intervenção. Não sei em que é que a minha vida e a dos outros clientes daquele café vai melhorar ou piorar depois da minha observação, mas ao menos reclamei por um serviço que não estava a considerar adequado, e pode ser que assim, as pessoas desta cidade comecem a olhar mais para o outro, ou pelo menos comecem a dar o troco em mão.

23.7.08

Radiohead - knives out


O vídeo mais bonito do momento.

22.7.08

Não é a morte que me mata


Ainda pior que a convicção do não e a incerteza do talvez é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi.
Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem quase morreu está vivo, quem quase amou não amou. Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas idéias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono.
Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cór, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados.Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai.
Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza.O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.
Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance, para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos somente paciência porém,preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer.Pros erros há perdão; pros fracassos, chance; pros amores impossíveis, tempo.
De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance. Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar.
Desconfie do destino e acredite em você. Gaste mais horas realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando porque, embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu.

de Luís Fernando Veríssimo

O perigo das más interpretações são as interpretações más.

19.7.08


As minhas imperfeições são perfeitas.