Textos retirados do blog http://oarrumadinho.blogspot.com
Pais e Mães Solteiros
Lembro-me de há uns anos ter tido uma discussão violenta com uma pessoa que me disse que o facto de eu ter um filho representava "uma limitação". E apesar de, racionalmente, eu perceber o sentido da palavra "limitação", e de até entender que para uma mulher solteira e sem filhos será mais confortável envolver-se com um homem sem filhos, custou-me muito ouvir aquilo. E quem pensa assim poderá estar a querer evitar um problema para mergulhar num ainda maior.
Nos dia de hoje parece-me demasiado preconceituoso e até estúpido pensar-se que os pais (ou mães, claro) divorciados são "fontes de problemas", e que os filhos que eles trazem de outros relacionamentos representam "uma limitação". Mas será preferível encontrar uma pessoa que não tem essa limitação, mas que depois é viciado em álcool? É preferível encontrar uma pessoa que não tem essa limitação, mas depois trabalha 15 horas por dia, e passa os fins-de-semana a trabalhar no computador de casa? É preferível encontrar uma pessoa que não tem essa limitação, mas depois odeia viajar, não gosta de livros e passa o dia em casa deitado no sofá a vegetar? É preferível encontrar uma pessoa que não tenha essa limitação, mas que se revela um ser completamente acéfalo e desinteressante?
Todos temos limitações, umas maiores do que outras, umas mais graves do que outras, mas claro que para se vencerem essas limitações é preciso esforço e empenho. Conquistar uma criança, o seu afecto, o seu amor, parece-me uma tarefa bem mais interessante do que afastar um homem do álcool, da droga, ou lutar contra a profissão dele, para que a relação não esteja sempre em terceiro ou quarto plano (atrás do trabalho, dos amigos, da família, etc.).
Claro que há gente que pode não ir à bola com criancinhas, mas lá está, ultrapassar potenciais problemas dá trabalho, obriga a alguns sacrifícios, mas as relações fazem-se, também, de momentos altruístas, em que se calhar não estamos a fazer o que mais nos apetecia na altura, mas estamos a "trabalhar" para a felicidade comum. Para um padrasto ou uma madrasta, ir à Kidzania com o enteado pode ser a coisa mais entediante do mundo, mas também pode ser um momento em que nos entregamos a ele e participamos, com ele, num momento de felicidade, o que só irá fazer com que ele goste mais daquela pessoa nova que entrou na vida dele.
Claro que depois há o outro lado, que não depende da criança, que é a relação do nosso companheiro ou companheira com a ex ou o ex. É óbvio que vai ter de haver esse contacto durante muitos anos, mas parece-me que quando os casais estão separados todas as conversas, todos os contactos, todos os assuntos andam à volta do mesmo: a criança. Há gente mais intrometida, há casos de paranóia, mas na maior parte dos casos o tempo resolve isso.
Acredito, sobretudo, que quando se ama não se deve desistir de alguém só porque essa pessoa tem um filho de outra relação. Conquistar a criança pode ser um desafio fascinante, que terá como retribuição amor. E isso não tem preço.
Por outro lado, hoje em dia, quando o número de divórcios cresce todos os anos, quando parece que todos temos cada vez menos paciência para fazer funcionar os casamentos, o que mais começa a haver é pais e mães solteiros. E a pessoa que hoje recusa um homem porque ele tem um filho pode bem ser, amanhã, a discriminada. Pensem nisso.
É tão difícil encontrar gente boa, interessante. Se vamos limitar o universo, excluindo os que já têm filhos, arriscamo-nos a acabar com um traste. Mas ao menos vem sem "mochila". Que bom.
Os filhos mudam tudo
Os filhos mudam tudo.
Deve ser uma das frases que mais oiço a pais vividos, quando em conversa com os pretendentes a papás.
E na verdade os filhos mudam tudo.
Há quatro dias, uma das minhas melhores amigas foi mãe.
Há três dias, um dos meus melhores amigos, que foi pai há uns meses, separou-se.
A ela tive de dizer que os filhos mudam tudo, e alertei-a para muitos perigos de quem já passou pelo nascimento de um filho; a ele tive de dizer que os filhos mudam tudo, e tranquilizá-lo quanto ao futuro, porque também já passei por tudo o que ele está a passar.
Hoje, acho que os filhos mudam tudo, mas tenho a certeza de que é fácil ser-se feliz com a nova realidade que nos bate à porta de um dia para o outro, e que nos rouba muitos momentos fantásticos a dois, substituindo-os por outros que podem ser ainda melhores, mas a três. E o mais importante de tudo é mesmo ter a noção do que se vai encontrar, perceber o que vai mudar, ter consciência do trabalho e das privações que vamos ter pela frente, e estar preparado para todo esse mundo novo.
A maior parte dos casais que se separam após o nascimento de uma criança não sabem lidar com esse mundo novo. Não o dominam – deixam-se dominar; não o enfrentam – anulam-se; não percebem que a vida deles não acabou – está apenas a começar num novo formato.
Os medos delas
Homens e mulheres têm posturas diferentes relativamente à questão da gravidez/nascimento da criança. Já assisti a imensas discussões sobre este assunto e quase todos batem nas mesmas teclas.
Elas sentem-se mal com o corpo, porque engordaram como nunca e têm borbulhas, e tornozelos agigantados. Sentem-se mal de saúde, porque estão muitas vezes enjoadas, e inchadas e com dores de costas. Sentem-se com a auto-estima em baixo, porque se acham feias e desinteressantes. Sentem-se amedrontadas, porque têm medo de falhar, têm medo do desconhecido, têm medo de não corresponder ao que lhes é exigido, têm medo de não saber tratar de um bebé. Sentem-se inseguras, porque acham que os parceiros já não as acham sexy e vão querer saltar para cima da colega de trabalho. Sentem-se perdidas, porque já não estão a trabalhar, mas também ainda não têm assim tanta coisa para tratar relativamente ao nascimento da criança. Sentem-se receosas, porque fazem contas à vida e começam a perceber as despesas todas que vão ter. Sentem-se pressionadas, porque os pais e os amigos estão sempre a dar palpites sobre o que elas devem fazer e não fazer.
Na verdade, tudo isto gera, muitas vezes, depressões pré ou pós-parto. Há casos, até, de depressões pré e pós parto, que podem durar por um período indeterminado. Mas como qualquer doença, também isto se cura. O problema maior é mesmo que o doente reconheça que está doente, e esteja disposto a tratar-se, o que nem sempre acontece.
Grande parte dos conflitos entre os casais que têm ou vão ter o primeiro filho advém de algumas destas fragilidades e mutações por que o casal passa.
O papel deles
Ao homem cabe o papel de tentar, de alguma forma, tranquilizar a mulher, ajudar em tudo o que lhe for possível, não deixar que ela entre em pânico, continuar a dar-lhe provas de amor e, também ele, começar a preparar-se para a tal nova realidade que aí vem e que lhe irá, seguramente, alterar rotinas, prioridades, sonos, programas.
O papel deles
Ao homem cabe o papel de tentar, de alguma forma, tranquilizar a mulher, ajudar em tudo o que lhe for possível, não deixar que ela entre em pânico, continuar a dar-lhe provas de amor e, também ele, começar a preparar-se para a tal nova realidade que aí vem e que lhe irá, seguramente, alterar rotinas, prioridades, sonos, programas.
Sinceramente, acho que só é possível superar todas as dificuldades relativas ao nascimento de uma criança se a relação entre o casal for muito forte, cúmplice e assente em amor, amizade e companheirismo. Se uma qualquer destas coisas começa a faltar, o mais provável é a torre vir abaixo. Se o amor já é fraco, ou ainda não é suficientemente forte, a vontade de parte a parte em superar tudo e muito menor. Se não há companheirismo, perde-se o respeito, e sem respeito vai-se o amor, e sem amor vai-se tudo.
Este é um jogo de equilíbrios delicado que assusta um bocadinho, mas que todos devem estar cientes de que existe. Mas se decidimos que vamos a jogo temos, os dois, de conhecer as regras.
Os pais que se anulam
Outro dos maiores problemas após o nascimento da criança tem a ver com o facto de muitos pais deixarem-se anular por completo. Deixam de fazer tudo, mas mesmo tudo, por causa da criança. Não há cinemas, não há férias, não há jantares de amigos, não há saídas a dois, porque primeiro está o bebé. Naturalmente que quem nunca teve um filho fica assustado com essa tal realidade nova, não sabe o que fazer, mas por isso disse antes que é preciso conhecer as regras de jogo, e as regras de jogo dizem que é preciso ter bom senso, é preciso ser adulto, é preciso perceber que sem momentos de felicidade a dois (ou até sozinhos - porque também precisamos de tempo para nós, homens e mulheres) jamais haverá momentos de felicidade a três, porque a união quebra-se, porque ninguém é feliz, porque deixou de haver um amor entre três pessoas, e passou apenas a haver uma mãe que ama um filho, um pai que ama um filho, e não há um pai que ama uma mãe, apenas um homem e uma mulher que tratam de uma criança.
O sexo
Pode parece estúpido ou até uma falta de sensibilidade falar de sexo nesta altura, mas a sexualidade também desempenha um papel fundamental nesta fase da vida de um casal que vai ter ou teve recentemente um filho (“lá estão os homens a pensar no sexo, e sempre a pôr o sexo à frente de tudo”, vão pensar algumas leitoras). Quando falo de sexualidade falo sobretudo de intimidade. A baixa auto-estima das mulheres leva a que muitas vezes se afastem dos companheiros, que recusem todos os contactos ou aproximações mais íntimas. As hormonas também têm aqui um papel importante, é evidente, e os níveis de desejo podem baixar significativamente. Mas uma coisa é não ter desejo, outra é afastar-se sexualmente do companheiro durante três, seis, nove meses, ou por vezes durante mais tempo. Não chega dizerem-nos “Olha, amanha-te, porque agora tive um filho teu e não me apetece”. Da mesma forma que os homens têm de perceber que nesse capítulo as coisas são diferentes, as mulheres devem entender que não podem, pura e simplesmente, deixar de existir enquanto mulheres e passarem a ser exclusivamente mães. Muitos amigos meus queixam-se disso mesmo: “Agora já não tenho mulher, tenho uma mamã lá em casa”. E isso é outro dos factores que levam ao afastamento entre os casais. O sexo é uma forma de aproximação entre os casais em qualquer altura, é um momento de intimidade e amor. E quando isso se vai, lá está, tudo o resto pode ruir.
Um filho muda tudo.
Mas pode ser a melhor coisa do mundo para um casal.
É só ser crescidinho, ter bom senso e muito amor para dar. Ao filho e ao parceiro ou à parceira.
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